O Novo Peso-Pesado da Indústria Farmacêutica: Por que a Novo Nordisk vai investir R$6,4 bilhões no Brasil?

SÃO PAULO — Em meio à explosão global da demanda por medicamentos contra obesidade e diabetes, a dinamarquesa Novo Nordisk acaba de anunciar um dos maiores aportes privados do setor farmacêutico no Brasil: R$6,4 bilhões para ampliar sua fábrica em Montes Claros, no norte de Minas Gerais.

A nova planta terá 74 mil metros quadrados e será dedicada à produção de medicamentos injetáveis, como os famosos semaglutídeos, princípio ativo do Ozempic e Wegovy — produtos que transformaram o balanço da empresa e disputam espaço nas prateleiras do mundo inteiro.

A expectativa é que as operações comecem em 2028, mas o movimento já marca uma virada estratégica para o Brasil no mapa da farmacêutica: além de ampliar a capacidade produtiva local, o país será alçado à condição de hub de exportação global, abastecendo mais de 70 países a partir do solo mineiro.

Por que o Brasil?

Fábrica da Novo Nordisk em Montes Claros, MG.

O Brasil já é hoje o quinto maior mercado da Novo Nordisk no mundo, atrás apenas dos Estados Unidos, China, Japão e Alemanha. E o que antes era uma base comercial e regulatória, agora ganha um novo papel: centro de manufatura e logística global.

A escolha por Montes Claros não é por acaso. A empresa opera no município há mais de 15 anos, e ali já possui infraestrutura, mão de obra treinada e relacionamento consolidado com autoridades locais e ambientais — um trunfo em um setor onde o licenciamento pode atrasar projetos por anos.

Além disso, o governo federal e o estado de Minas Gerais devem apoiar o projeto com incentivos fiscais e benefícios logísticos, dentro de programas voltados à reindustrialização e fortalecimento da cadeia farmacêutica.

O peso do investimento

O valor de R$6,4 bilhões representa não apenas o maior investimento privado da Novo Nordisk no Brasil, mas também um dos maiores aportes já feitos por uma farmacêutica no país — e o maior da história do setor em Minas Gerais.

A maior parte dos recursos será destinada à construção de novas linhas de produção asséptica, um laboratório de controle de qualidade e um armazém automatizado. A meta é triplicar a capacidade da fábrica de Montes Claros para medicamentos injetáveis, com foco em canetas prontas para uso com semaglutídeo — princípio ativo de produtos como Ozempic e Wegovy.

Hoje, a unidade já responde por cerca de 12% do consumo global de insulina da Novo Nordisk, além de produzir insumos e dispositivos para análogos de GLP-1. Com a expansão, o Brasil deixará de ser apenas um centro de produção de insumos e passará a fabricar em larga escala os medicamentos acabados, prontos para exportação.

A fábrica também reforçará o compromisso ESG da companhia. Será construída com padrões de baixo impacto ambiental, uso exclusivo de energia renovável e metas de zero emissão líquida. O projeto deve gerar milhares de empregos diretos e indiretos, com forte demanda por engenheiros, operadores de equipamentos estéreis e profissionais qualificados da área farmacêutica.

A ampliação muda o papel do Brasil dentro da estrutura global da Novo Nordisk — de um elo auxiliar da cadeia de insulina para um polo importante no fornecimento de medicamentos de ponta para mais de 70 países.

A corrida global contra a obesidade

O investimento da Novo Nordisk no Brasil precisa ser lido dentro de um contexto mais amplo: a corrida por capacidade de produção de medicamentos contra obesidade e diabetes.

Em 2023, a empresa superou brevemente a LVMH como a companhia mais valiosa da Europa, impulsionada pelo sucesso de Ozempic e Wegovy. Juntos, os dois remédios responderam por mais de US$12 bilhões em receita no último ano — e a demanda continua crescendo acima da capacidade instalada.

Analistas do setor estimam que o mercado global de antidiabéticos e antiobesidade pode triplicar até 2030, alcançando a marca de US$100 bilhões. E empresas como a Eli Lilly e a própria Novo Nordisk estão em uma corrida por fábricas, insumos e canais logísticos.

Neste cenário, ter o Brasil como base de produção e exportação torna-se vantagem competitiva — tanto em termos de custo como de agilidade.

A nova geopolítica da produção de remédios

Caneta Ozempic

O movimento da Novo Nordisk também revela um novo padrão da indústria: a descentralização da produção farmacêutica. A pandemia expôs os riscos da concentração industrial na Ásia e, desde então, multinacionais passaram a buscar alternativas logísticas mais próximas dos seus mercados finais.

Nesse contexto, o Brasil ressurge como um destino competitivo. Além do tamanho do mercado interno, o país oferece acordos de comércio com dezenas de países e posição privilegiada para exportações às Américas e Europa.

A aposta da Novo Nordisk é ambiciosa — mas tem lógica econômica e geopolítica. E coloca o Brasil, mais uma vez, no centro do tabuleiro da indústria global.