José Olympio vs. André Esteves: A Competição Entre Credit Suisse e BTG Pelo Mercado de Investimentos

SÃO PAULO — Durante quase duas décadas, BTG Pactual e Credit Suisse foram protagonistas no mercado de bancos de investimento no Brasil, disputando mandatos de IPOs, fusões e aquisições e grandes operações financeiras. Se, por um lado, o Credit Suisse dominava com sua estrutura global e acesso ao capital internacional, o BTG Pactual se firmou como um player local agressivo, ágil e com um modelo de negócios independente.

Essa competição, que refletia duas visões distintas sobre como operar no mercado brasileiro, não aconteceu de forma explícita como um embate entre seus principais executivos — José Olympio Pereira, no Credit Suisse, e André Esteves, no BTG — mas sim como uma batalha silenciosa entre dois modelos de negócios opostos. Enquanto o Credit Suisse apostava em sua presença global e no relacionamento com multinacionais, o BTG Pactual crescia no Brasil com flexibilidade, transações sofisticadas e apetite por risco.

Essa rivalidade definiu as grandes operações do mercado financeiro nacional ao longo dos anos 2000 e 2010, em um período de crescimento acelerado, onde os dois bancos se enfrentaram para captar os principais mandatos de assessoria financeira e dominar o setor de investimentos. Mas a partir de 2019, o cenário começou a mudar: o Credit Suisse, antes líder absoluto no setor, viu sua força ser corroída por problemas internos e crises globais, enquanto o BTG Pactual ampliava seu domínio e se tornava a maior casa de investimentos independente do Brasil.

Com a absorção do Credit Suisse pelo UBS em 2023, a rivalidade entre os dois bancos chegou ao fim. No entanto, a trajetória de ambos diz muito sobre as transformações do setor financeiro no Brasil e sobre como um banco local conseguiu vencer a concorrência de um gigante global.

Os Anos de Expansão do Credit Suisse e a Liderança de José Olympio

A presença do Credit Suisse no Brasil remonta a 1990, mas foi com a aquisição do Banco Garantia em 1998, por pouco mais de US$1 bilhão, que o banco suíço firmou sua posição como um dos grandes players do mercado financeiro nacional. A compra do Garantia, fundado por Jorge Paulo Lemann, Marcel Telles e Beto Sicupira, foi um dos primeiros movimentos de bancos globais para ganhar relevância no mercado brasileiro. O Garantia era conhecido por sua cultura agressiva e por ter formado uma geração de banqueiros com apetite por risco e profundo conhecimento de mercado.

Com essa aquisição, o Credit Suisse absorveu esse know-how e passou a competir diretamente com os bancos de investimento locais. A estratégia foi fortalecer a divisão de investment banking e consolidar sua liderança no mercado de fusões e aquisições (M&A), além de ampliar sua atuação no mercado de capitais.

Foi nesse contexto que José Olympio Pereira emergiu como um dos principais nomes do setor. Com passagens pelo próprio Garantia e pelo Goldman Sachs, Olympio se tornou o líder da operação brasileira do Credit Suisse e transformou a instituição no maior assessor financeiro do país durante os anos 2000 e 2010. Sua abordagem combinava uma rede global de relacionamento com multinacionais e investidores institucionais, acesso privilegiado ao capital estrangeiro e uma estrutura capaz de conduzir operações complexas e de grande porte.

Sob sua gestão, o banco suíço figurou por anos no topo do ranking de fusões e aquisições no Brasil, sendo responsável por algumas das transações mais relevantes da história recente do mercado. Entre os principais negócios assessorados pelo Credit Suisse no período, destacam-se:

• O IPO da BMF&Bovespa em 2007, que levantou R$6,6 bilhões, um dos maiores da época.

• A venda da Redecard para o Itaú por R$11,8 bilhões em 2012, consolidando a força do banco no setor financeiro.

• Em 2011, ficou em segundo lugar no ranking de M&A, atrás apenas do BTG Pactual, assessorando 33 transações avaliadas em US$29,7 bilhões.

Além de sua presença no mercado de M&A, o Credit Suisse também liderava em operações de mercado de capitais, especialmente na estruturação de ofertas de ações e dívidas para empresas brasileiras que buscavam liquidez. Em 2010, a instituição foi uma das responsáveis pelo IPO da Petrobras, que levantou impressionantes R$120 bilhões, tornando-se a maior oferta pública de ações da história até então.

A influência de José Olympio no mercado financeiro brasileiro era tamanha que o Credit Suisse frequentemente era visto como o banco de investimento preferido das grandes corporações do país. O banco suíço conquistou um portfólio de clientes robusto, assessorando algumas das maiores empresas nacionais em sua expansão internacional.

Contudo, apesar da solidez da operação no Brasil, o Credit Suisse enfrentava desafios internos, especialmente após a crise financeira de 2008 e a crescente regulamentação internacional que limitava a flexibilidade dos grandes bancos globais. Ainda assim, sob a gestão de José Olympio, a instituição conseguiu manter sua relevância e se consolidou como a principal referência em transações financeiras de grande porte no Brasil.

Mas enquanto o Credit Suisse operava com a segurança de um banco global e a força de sua marca, um concorrente começava a se estruturar para desafiar sua hegemonia: o BTG Pactual.

O Nascimento do BTG Pactual e a Agressividade de André Esteves

Enquanto o Credit Suisse avançava no Brasil como uma potência estrangeira, o BTG Pactual surgia como um contraponto: uma casa nacional, independente e com grande apetite por risco.

O embrião do banco nasceu em 1983, quando o Banco Pactual foi fundado no Rio de Janeiro. Ao longo dos anos 1990 e início dos anos 2000, o Pactual se firmou como uma das principais boutiques de investimento do país, com um modelo de parceria semelhante ao do antigo Banco Garantia.

Mas foi em 2006 que sua história mudou radicalmente. Naquele ano, o UBS comprou o Pactual por US$3,1 bilhões, na tentativa de transformá-lo em sua principal plataforma de investimentos na América Latina. O plano, no entanto, foi frustrado pela crise financeira global de 2008, que levou o UBS a reavaliar sua estratégia e a buscar desinvestimentos.

Foi então que, em 2009, um grupo de executivos liderado por André Esteves recomprou o banco das mãos do UBS, por quase o mesmo valor da venda, US$2,5 bilhões. Assim, nasceu o BTG Pactual, um banco totalmente independente, controlado por sócios e com um modelo de negócios baseado em transações agressivas e alavancagem estratégica.

Diferente do Credit Suisse, que operava dentro das diretrizes de um banco global e estava sujeito às restrições de sua matriz suíça, o BTG tinha autonomia total para tomar decisões rápidas e assumir posições de risco no mercado financeiro brasileiro.

O banco cresceu rapidamente em diversas frentes, destacando-se nos setores de private equity, crédito estruturado e mercado imobiliário. Sua estratégia envolvia a compra de participações em empresas e a realização de operações de M&A ousadas. Entre os principais negócios liderados pelo BTG Pactual, destacam-se:

• A compra de 25% da Rede D’Or por R$600 milhões em 2010, 5 anos depois, vendeu por R$4 bilhões

• A aquisição do banco suíço BSI por US$ 1,7 bilhão, fortalecendo sua atuação no private banking global.

•  Em 2011, o banco assessorou 38 transações avaliadas em US$41 bilhões, conquistando a liderança no mercado brasileiro de M&A. 

O BTG também se tornou referência no setor de mercado de capitais, disputando mandatos de IPOs e follow-ons com o Credit Suisse. O banco estruturou algumas das maiores ofertas públicas da bolsa brasileira, aproveitando sua agilidade para atuar rapidamente em janelas favoráveis.

Além disso, o BTG Pactual se diferenciou por sua capacidade de operar no mercado de risco de forma mais dinâmica do que seus concorrentes. Ao contrário do Credit Suisse, que dependia do capital externo, o BTG utilizava seu próprio balanço para financiar aquisições, fornecer crédito estruturado e operar alavancado, uma estratégia que aumentava seus retornos, mas também sua exposição ao risco.

A rápida ascensão do BTG incomodou os bancos tradicionais e, em 2015, a instituição enfrentou seu momento mais difícil: a prisão de André Esteves, acusado de envolvimento em um esquema de corrupção investigado pela Operação Lava Jato. Sua saída temporária do banco gerou instabilidade, e a casa viu seu valor de mercado despencar, além de sofrer com a fuga de clientes.

No entanto, em poucos anos, Esteves foi inocentado das acusações e retornou ao comando do banco. Com sua volta, o BTG iniciou um novo ciclo de crescimento, dobrando seu volume de ativos sob gestão e se transformando na maior instituição financeira independente do Brasil.

Os Conflitos Diretos e a Queda do Credit Suisse

Durante o boom de IPOs entre 2007 e 2013, e depois entre 2019 e 2021, os dois bancos estavam entre os mais ativos na coordenação de ofertas públicas iniciais de empresas brasileiras.

Apesar dessas batalhas, a partir de 2019, o cenário começou a mudar. O Credit Suisse começou a perder força globalmente devido a uma série de escândalos financeiros e investimentos problemáticos, como o caso do Greensill Capital e do Archegos Capital, que resultaram em perdas bilionárias. Isso enfraqueceu sua posição no Brasil, levando José Olympio a deixar a presidência do banco em 2021. Em 2023, ele assumiu a presidência do Banco Safra.

Enquanto isso, o BTG Pactual aproveitou esse vácuo para crescer. Com maior capital disponível e um modelo mais eficiente para o mercado brasileiro, o banco acelerou sua expansão e passou a dominar a cena de banco de investimentos no país.

A crise do Credit Suisse culminou em sua compra pelo UBS em 2023, por US$3,25 bilhões, que marcou o fim de sua trajetória independente. O banco que, por anos, havia sido referência no mercado brasileiro, acabou perdendo sua identidade, enquanto o BTG Pactual superou os R$1,9 trilhão em ativos sob gestão e consolidou-se como a maior casa de investimentos independente da América Latina.